Membros da sociedade civil angolana prometem sair às ruas, em marcha, antes, durante e depois das eleições gerais caso o Tribunal Constitucional não impugne o processo, devido a alegadas irregularidades.
Numa conferência de imprensa realizada hoje, em Luanda, o porta-voz do colectivo de mais de 26 grupos da sociedade civil, Alexandre Barros, garantiu ser esta a via ideal para forçar o Tribunal Constitucional e outras instituições angolanas (dominados pelo MPLA) envolvidas na organização das eleições a pautarem por um processo eleitoral isento.
“Iremos esgotar todas possibilidades jurídicas e formais no intuito de pressionar o Tribunal Constitucional, porque a nossa acção será agora, e durante as eleições, e se, ainda assim, o mesmo tribunal não impugnar as eleições, nós, sociedade civil vamos voltar às ruas, por todo país, e usar também os mecanismos para exigir que a CNE [Comissão Nacional Eleitoral] reponha a legalidade”, garantiu.
Quanto à marcha convocada para quarta-feira, em Luanda, e que conta com a participação de grupos e associações como a ANATA – Associação Nova Aliança dos Taxistas de Angola, o Movimento Revolucionário ou a Sociedade Civil Contestatária, entre outros, em defesa da transparência no processo eleitoral, vai acontecer pelas ruas de Luanda, apesar de o Governo Provincial indeferir a sua realização.
“Infelizmente, como é hábito, o Governo Provincial de Luanda proibiu-nos de realizar a marcha, mas para nós é uma medida insignificante, pois já sabíamos que a resposta seria negativa, tal como tem sido desde 2011. Ainda assim, nós vamos realizar a nossa marcha, porque a lei é clara: o Governo Provincial não tem legitimidade para autorizar ou indeferir realizações de marchas. Apelamos à presença de todos os angolanos, de Cabinda ao Cunene, para juntos marcharmos até ao Tribunal Constitucional”, disse.
Também hoje, estes grupos estiveram reunidos com peritos da União Europeia a quem expressaram os seus descontentamentos, sentindo que “eles já conhecem a realidade dos pleitos eleitorais em Angola”.
“Apresentámos as irregularidades que existem no processo eleitoral, de modo geral, as mesmas que constam do manifesto que remetemos ao Tribunal Constitucional. Sentimos também que o que apresentamos serve de prova de que os pleitos eleitorais em Angola são uma farsa”, finalizou.
O manifesto aponta várias irregularidades, entre as quais a contratação habitual da empresa espanhola INDRA para gerir o processo eleitoral; a constituição da Comissão Nacional Eleitoral (sucursal do MPLA), que é composta, maioritariamente, por membros do partido no poder; a instrumentalização dos meios de comunicação social públicos e forças de seguranças; e a presença de nomes de pessoas mortas nos cadernos eleitorais.
De facto, os números não deixam de surpreender. São milhares? Não! Milhões! O MAT, mancomunado com os SME, vão escancarar as fronteiras de Angola com os países vizinhos, para entrarem “falsos” cidadãos, autênticos mercenários eleitorais, vindos das República Democrática do Congo, República do Congo, Mali, Eritreia, Etiópia, Guiné Conacri, São Tomé, que entrarão pelas províncias do Uíge, Cabinda, Zaire, Lundas Norte e Sul, Moxico.
Os locais onde antes haviam controlos policiais fronteiriços foram levantados e a entrada é como o deslize de faca quente em manteiga mole.
A convicção está aqui: “Não teremos eleições livres e justas! Teremos, sim, eleições fraudulentas e batotadas, legalizadas e confirmadas pelo regime e seus “lacaios” observadores, africanos, latino-americanos e europeus, corrompidos, nomeadamente, de Cabo Verde, São Tomé e Príncipe, Moçambique, do PAIGC, da Guiné-Bissau, do Ruanda, do Congo Brazzaville e da RDC, grupo de Kabila, Guiné Equatorial, Venezuela, Cuba, Nicarágua, Portugal (PCP, PSD, PS e similares), Espanha, entre outros, pois tudo está montado, o resto é teatro”, denunciou, em exclusivo ao Folha 8, Armando Joaquim Faria, técnico eleitoral.
Real ou falso, todos os procedimentos dos órgãos eleitorais (CNE), do Executivo (Ministério da Administração do Território) e Tribunal Constitucional (presidido por Laurinda Cardoso, membro do bureau político do MPLA – partido no poder há 47 anos e concorrente à própria sucessão), são sinuosos e suspeitos, pois pendem em sentido contrário à Constituição e à Lei.
“Vocês pensam que o Presidente João Lourenço, responsável pela maior ravina no seio MPLA, com o seu carácter arrogante, de boçalismo, falta de tacto e visão política, vai querer, depois de ter feito tanta porcaria, sair no final do primeiro mandato? Ele tem noção que se isso acontecer ele será crucificado pior do que ele fez a José Eduardo dos Santos”, defende Armando Joaquim Faria.
“João Lourenço está disposto a tudo. Por esta razão as Forças Armadas e a Polícia Nacional já têm unidades de prevenção, com equipamentos novos, prontos a entrarem em acção, caso o povo insista em dar a vitória à UNITA, que neste momento, pelo que estamos a ver, pela primeira vez, em Angola, Adalberto da Costa Júnior está a materializar uma profecia de Jonas Savimbi, conseguindo congregar muitas franjas das populações, inclusive, descontentes e não só do MPLA, num projecto de poder, que está a mobilizar os cidadãos e o país”, salienta.
Os brutos não respeitam a democracia. Os brutos amam as armas, a ditadura e o poder.
“Angola, infelizmente, se os Estados Unidos e a União Europeia, não fiscalizarem o processo eleitoral, poderá transformar-se, em Agosto/Setembro de 2022, num verdadeiro rio de sangue”, alerta Adriano Joaquim Faria.
Os povos, a grande maioria, clama por alternância, face aos elevados e longos anos de pobreza, miséria e desemprego. O regime, no poder há 47 anos, com todos os recursos do Estado à sua disposição, luta pela manutenção.
A sociedade civil e os intelectuais, na sua bondade ou ingenuidade, acreditam que os votos dos cidadãos poderão determinar, em Agosto de 2022, a tão ansiada nova aurora.
Mas uns poucos alimentam o cepticismo de tudo indiciar um desfecho de grave crise militar, “pois João Lourenço, que foi ao pote com tanta sede de poder, ao ponto de não ter contemplação, em relação a quem lhe deu o poder de bandeja, ‘assassinando-o’, politicamente, em hasta pública, perseguindo, prendendo e expulsando do país os filhos e familiares do clã Dos Santos, tudo fará, incluindo a guerra, para continuar no poder, assessorado pelo MAT (Administração do Território), CNE, Casa Militar, FAA e a Polícia Nacional”.
A pipocagem de eleitores fantasmas soma e segue, como se denuncia: Em Setembro de 2021 o MAT previa cerca de doze milhões de eleitores. Aos 31 de Março de 2022 o MAT declarou 12.977.000. Uma semana depois, a 7 de Abril, o MAT informou que o país tinha registado 14 milhões de eleitores. Em 28 de Abril de 2022, o Ministro da Administração do Território avançava com o número de cerca de 14 milhões de eleitores, mas admitia que “este número ainda vai sofrer “uma redução significativa”. O número definitivo de eleitores, constante do Ficheiro Informático de Cidadãos Maiores entregue pelo Ministério da Administração do Território à Comissão Nacional Eleitoral de 14.390.391 eleitores, vem demonstrar, surpreendentemente, que o número ao invés de reduzir aumentou.
Esta situação pode levar-nos a duas leituras: Ou não fizeram a depuração, e permitiram que os cidadãos falecidos durante os últimos 5 anos estejam na Base de Dados de Cidadãos Maiores, e em consequência, no Ficheiro Informático de Cidadãos Maiores ou há manipulação tendenciosa para fins fraudulentos.
Neste quadro dantesco, de tensão política, as eleições poderão dar lugar ao “Cacimbo Angolano”, com permanentes manifestações de rua, apoiadas pelo Ocidente, que poderá ter já em manga, um rascunho de contundente condenação ou reconhecimento.
Folha 8 com Lusa